Cor: Índigo
Símbolo matemático: conjunto vazio
Temas: Vazio, falta, subjetividade, espera, mergulho, cotidiano, exagero, esvaziamento, direitos, experiência, cumprimento, direção, afastamento, reorganização, preenchimento, passagem
Data aproximada de escrita: janeiro, fevereiro e março de 2025
1. Ninguém me preencheu
Nunca tive ninguém
Ninguém nunca me teve
Eu quis impor um porém
A recusa não me deteve
Nunca olhei ninguém
Ninguém nunca me olhou
Eu quis ficar mais aquém
O alarme não me agradou
Nunca acudi ninguém
Ninguém nunca me acudiu
Eu quis pensar um além
A penúria não me iludiu
Nunca motivei ninguém
Ninguém nunca me motivou
Eu quis juntar mais vintém
O colapso não me alarmou
Ninguém me preencheu
Esperei
Que respondessem tudo que me movimentou
Desejei
Que acolhessem tudo que me acompanhou
Convoquei
Que repensassem tudo que me transformou
Provoquei
Que recolhessem tudo que me descontrolou
Ninguém me preencheu
A ciência, a religião
A união, a consciência
Não me preencheram
A arte, a natureza
A paz, a filosofia
Não me preencheram
Ninguém me preencheu
A falta de algo, a sexualidade
A sensação da completude
Não me preencheram
A evolução, a solitude
A noção da transitoriedade
Não me preencheram
Ninguém me preencheu
2. Subjetivo
Vivo na minha cabeça
Não ajo com muito viço
Duvido do que me oferecem
Não moldo os atos do mundo
Vivo na minha cabeça
Não ajo com muito relevo
Desvio do que me enviam
Não dito os medos da vida
Subjetivo
Dentro de mim, vivo
O eu interior me provoca
Fora de mim, aguento
O eu exterior me incomoda
Dentro de mim, creio
O eu introvertido me salva
Fora de mim, observo
O eu extrovertido me roga
Subjetivo
Divirto-me por dentro
Espero-me por fora
O problema é o equilíbrio
A resposta me impacta
Refaço-me por dentro
Situo-me por fora
O sentimento é o balanço
A loucura me questiona
Subjetivo
Dentro dos meus escritos, detalho
O passado me acompanha
Fora dos meus gritos, estaco
O presente me impressiona
Dentro das minhas ideias, transcedo
A amizade me aconselha
Fora das minhas traqueias, murcho
A inimizade me entristece
Subjetivo
A palavra me atravessa
A teoria me vincula
Subjetivo
A ação me revela
A prática me pertuba
Subjetivo
3. Esperar
Esperar
Que o poema chegue
Que a ideia se apresente
Esperar
Que a voz questione
Que a pausa se complete
Esperar
Que a guerra desmorone
Que a bagunça se propague
Esperar
Que o desprezo rotule
Que a ignorância se louve
Esperar
Esperar por pessoas que não poderei
alcançar
Esperar por distinções que não poderei alterar
Esperar por direitos que não poderei conservar
Esperar por provocações que não poderei evitar
Esperar
Não consigo bater de frente com o mundo
Ele é mais poderoso, mais apoiado
Sou um mero corpo esquecido
Não consigo encarar de frente a maldade
Ela é mais ardilosa, mais valorizada
Sou um mero ser recolhido
Esperar
Um dia algo se assentará
Não posso move-lo
Não poderei regula-lo
Um dia algo se mostrará
Não posso conte-lo
Não poderei irrita-lo
Esperar
4. Águas que mergulho
Não quero performar gênero
Não quero reforçar nada
Tentar me enquadrar foi fatal
Quase me levou ao esgotamento
Não quero perpetuar crítica
Não quero incomodar nada
Tentar me destacar foi banal
Quase me levou ao esquecimento
Eu e as minhas divagações
Eu e as minhas travessias
Repeli as observações
Codifiquei as entrelinhas
Eu e os meus devaneios
Eu e os meus redemoinhos
Lapidei os isolamentos
Relançei os problemas
Águas que mergulho
Entro em piscinas, mares, oceanos
Lacunas, narrativas, conexões
Me esqueço em derrotas, lidas, partidas
Alegrias, pausas, focos
Me ensaio em procuras, luzes, caminhadas
Subidas, arquivos, rascunhos
Saio de disputas, poderes, avarezas
Faltas, confusões, apegos
Águas que mergulho
Mergulho onde?
No que está saturado?
No que dá polêmica?
Mergulho onde?
No que não foi explorado?
No que não teve repercussão?
Onde estão essas águas?
No meu inconsciente?
No meu cérebro?
Onde estão essas águas?
Nas minhas células?
Na minha alma?
Águas que mergulho
5. O vazio no cotidiano
Filho da inconstância
Filho da preocupação
Aluno da desconfiança
Aliado da demolição
Filho da escassez
Filho da composição
Aluno da sensatez
Aliado da revelação
Tempo vazio
Templo vazio
Remo vazio
Centro vazio
Cetro vazio
Vento vazio
O vazio no cotidiano
Filho da doença
Filho da alienação
Aluno da desavença
Aliado da provocação
Filho da paciência
Filho da superação
Aluno da experiência
Aliado da discussão
Ódio vazio
Dito vazio
Medo vazio
Afeto vazio
Esteio vazio
Voto vazio
O vazio no cotidiano
O vazio no cotidiano
A recusa sem pensamento
O discurso conquistando
A lamúria sem momento
O vazio no cotiano
A ajuda sem fundamento
O engodo convocando
A miséria sem aposento
Vazios existem
Temos condições, opiniões
Isso isenta a existência do vazio?
Vazios existem
Temos julgamentos, movimentos
Isso isenta a permanência do vazio?
O vazio no cotidiano tende a se camuflar
Tende a se enganar ainda mais
O vazio no cotidiano
6. Tempestades (Exageros de um poeta)
Mudo em pontos que não mudava
Tentei combater um princípio
Lembro de pontos que não lembrava
Voltei a proteger um ofício
Provo as palavras que não provava
Falhei em arquitetar um martírio
Olho por palavras que não olhava
Cheguei a despertar um delírio
Exageros
Tempestades de um poeta
Uns se soltando
Outros se fechando
Eu no meio da tempestade
Será que ficarei boiando?
Uns se arruinando
Outros se revelando
Eu no meio do cataclisma
Sera que dormirei gritando?
Exageros
Tempestades de um poeta
Mentiras adoradas
Sensos esquecidos
Violências camufladas
Contrastes escolhidos
Instruções afastadas
Prazos descumpridos
Atenções espalhadas
Motivos suprimidos
Exageros
Tempestades de um poeta
Não aturam as diversidades
Acreditam na limitação
Incentivam a padronização
Não impedem as dificuldades
Ferem na omissão
Escolhem a perpetuação
Exageros
Tempestade de um poeta
7. Esvaziar
Será o desejo vazio?
O apoio inconsequente?
Devo ocultar o feitio?
Como esvaziar o inconsciente?
Será o desastre inevitável?
O apagamento conveniente?
Devo tolerar o improvável?
Como alcançar o transcendente?
Esvaziar
Há mais de cinco anos tento me preencher
Foram muitos poemas, livros, ideias e sonhos
Há mais de alguns meses tento me esvaziar
Foram muitos erros, perdas, acidentes e desilusões
Esvaziar
A obrigação da completude me incomoda
Parece errado estar vazio, com dúvidas
Estar desperto em meio as inundações
A confusão da indiferença me assusta
Parece certo estar alienado, com certezas
Estar contente em meio as futilidades
Esvaziar
Passarei a vida escrevendo?
Conseguirei me estruturar?
Será medo da mentira?
Será hábito de questionar?
Alcançarei a paz comovendo?
Buscarei me atrapalhar?
Será culpa da consciência?
Será vontade de compensar?
Esvaziar
Esvaziar e colocar o que no lugar?
Esvaziar não é tentar se libertar?
Esvaziar
8. Chuva de direitos
Quero chuva
Quero aconhego
Não quero um monte de desprezo
Não quero luta
Não quero medo
Eu quero uma torre de respeito
Quero chuva
Quero telhado
Não quero um prédio sem reparo
Não quero rusga
Não quero estrato
Eu quero uma terra sem conhavo
Chuva de direitos
Cadê a chuva?
Chuva que traz sossego
O incentivo racional
Cadê a chuva?
Chuva que traz emprego
O alimento essencial
Cadê a chuva?
Chuva que traz empatia
O cuidado habitual
Cadê a chuva?
Chuva que traz alegria
O descanso natural
Chuva de direitos
Não irão mais dominar
Enganar, zangar
Venha, chova!
Não irão mais disfarçar
Castigar, quebrar
Venha, chova!
Não irão mais instigar
Segurar, atacar
Venha, chova!
Não irão mais assustar
Humilhar, retirar
Venha, chova!
Venha, chuva de direitos!
Venha, chova!
Chuva de direitos
9. Passar!
Passar!
Já foi o desejo de chorar
Já foi o desejo de parar
Passar!
Passar!
Já foi o desejo de calar
Já foi o desejo de provar
Passar!
Passar!
Passar!
Já foi o desejo de mandar
Já foi o desejo de aprovar
Passar!
Passar!
Já foi o desejo de agradar
Já foi o desejo de brilhar
Passar!
Passar!
Ficar triste, e definhar?
Não! Passar!
Ficar hirto, e esperar?
Não! Passar!
Ficar louco, e atrapalhar?
Não! Passar!
Ficar vazio, e entulhar?
Não! Passar!
Passar!
Um jeito de contestar? Passar!
Um jeito de expressar? Passar!
Um jeito de incomodar? Passar!
Uma chance de embelezar? Passar!
Uma chance de mergulhar? Passar!
Uma chance de aproximar? Passar!
Passar!
Até a tranquilidade prosperar? Passar!
Até a experiência recuperar? Passar!
Passar!
10. Falhei em minha passagem?
Não protegi o espelho
Da flecha, do escudo
Falhei?
Não mascarei a vitrine
Do golpe, da enchente
Falhei?
Não procurei o poder
Da fama, do momento
Falhei?
Não descrevi o barulho
Do medo, do dissabor
Falhei?
Falhei em minha passagem?
Não escrevi o detalhe
Da história, do desejo
Falhei?
Não provoquei a mudança
Da ferida, da companhia
Falhei?
Não costurei a estima
Do olhar, do lembrete
Falhei?
Não recebi a garantia
Do saber, do conteúdo
Falhei?
Falhei em minha passagem?
A passagem é penosa?
Tenho que esvazia-la?
A passagem conforta?
Tenho que adorna-la?
A passagem é interessante?
Tenho que preenche-la?
A passagem constrange?
Tenho que estende-la?
Falhei em minha passagem?
Passagem falha tem qualidade?
Passagem falha tem liberdade?
Falhei em minha passagem?
11. Entender a estrada
Entender a estrada é difícil
A regra não é protegida
O jardim é esquecido
A folha não é definida
Entender a estrada é difícil
A vinha não é dividida
O vento é preterido
A chuva não é recolhida
A estrada no seu costumeiro vazio
A estrada na sua misteriosa incerteza
Entender a estrada
Entender a estrada é fatigante
A palavra é distorcida
O tempo é resumido
A vitória é produzida
Entender a estrada é fatigante
A torcida é repetida
O lugar é atingido
A refeição é decidida
A estrada no seu simpático vazio
A estrada na sua horrível incerteza
Entender a estrada
A estrada que não é ignorante
A estrada que não é conduzida
A estrada que não é acomodada
A estrada que não é mentirosa
A estrada que não é beligerante
A estrada que não é competitiva
Entendam essas estradas
A estrada que não é intolerante
A estrada que não é orgulhosa
A estrada que não é agressiva
A estrada que não é limitante
A estrada que não é avarenta
A estrada que não é maldosa
Entendam essas estradas
12. A permanência da falta
A permanência da falta
A maquiagem do vazio
A frequência da raiva
A roupagem do susto
A permanência da falta
A fragilidade do abrigo
A tendência da briga
A leviandade do preço
A permanência da falta
Consumismo, poder
A falta permanece
Não se importam em aprova-la
Extremismo, mentira
A falta permanece
Não se importam em divulga-la
A permanência da fala
Conservam os erros
Evitam os acertos
"Pra que me dedicar ao todo"?
Provocam os pequenos
Bajulam os grandes
"Pra que me amarrar ao outro"?
A permanência da falta
Repelimos a falta?
Enfrentamos os conceitos?
Acordamos os efeitos?
Requeremos os direitos?
Atraímos a falta?
Prolongamos os defeitos?
Toleramos os confeitos?
Comovemos os eleitos?
A permanência da falta
Jamais refletiu nisso?
Viu? A permanência!
Jamais reparou nisso?
Viu? A permanência!
13. Afastamento
Afastamento
De quem pensei que era parecido a mim
Afastamento
De quem eu provei que era longe de mim
Afastamento
De quem implorei que era certo para mim
Afastamento
De quem eu inventei que gostava de mim
Afastamento
Afastei
De quem não sabe recusar
Afastei
De quem não cabe ensinar
Afastei
De quem não sabe procurar
Afastei
De quem não cabe criticar
Afastamento
Afastando
Quem só sabe difamar
Afastando
Quem só curte atazanar
Afastando
Quem só sabe arruinar
Afastando
Quem só curte controlar
Afastamento
Afastarei
Os mentirosos, arrivistas
Afastarei
Os lamentosos, narcisistas
Afastarei
Os avarentos, convencidos
Afastarei
Os briguentos, distraídos
Afastamento
14. Reorganizar
Reorganizar
As lágrimas
Os livros
Os pedidos
Reorganizar
As faltas
Os temas
Os conflitos
Reorganizar
As escolhas
Os cursos
Os sonhos
Reorganizar
As saudades
Os bilhetes
Os votos
Reorganizar
Sei que ando triste
Preciso confrontar a causa
A lacuna me agride
Gostar demais me piora
Sei que vivo tímido
Preciso resolver o trauma
O abandono me choca
Sentir demais me isola
A organização cura?
A organização revela?
A organização ampara?
A organização distribui?
Reorganizar
Reorganizar além das coisas materiais
O que é pouco intrigante, lucrativo
O que é pouco triunfante, chamativo
Reorganizar além das coisas espirituais
O que é muito deturpado, ignorante
O que é muito espalhado, dominante
Reorganizar além das coisas universais
O que é muito evitado, irritante
O que é muito cercado, mitigante
Reorganizar além das coisas regionais
O que é pouco viajante, inventivo
O que é pouco aspirante, expressivo
Reorganizar o vazio, a passagem
Reorganizar a estima, o vínculo
Reorganizar
15. Preencher
Sabe o que quero
Não quis atender
Sabe que eu zelo
E tento conhecer
Sabe o que detesto
Não quis afastar
Sabe que eu espero
E tento reformar
E faço o que?
Impeço você
Volto a mercê
Querendo me preencher
Diz "nossa amizade"
Não indica meu trabalho
Diz "nossa família"
Não lembra do afeto
Diz "meu amor"
Não descobre meu gosto
Diz "meu modelo"
Não aceita meu defeito
E faz o que?
Tenta correr
Recusa o bufê
Querendo te preencher
Preencher pessoas
Preencher ideias
Preencher ações
Preencher plateias
Preencher terras
Preencher ausências
Preencher séculos
Preencher vivências
Fazemos o que?
Comparo vocês?
Valido o clichê?
Querendo nos preencher
Preencher...
Preencher
Preencher...
Preencher...
16. No vazio (da passagem)
No vazio
(da passagem)
Reuso o que provei
No vazio
(da passagem)
Recuso o que cobrei
No vazio
(da passagem)
Entulho o que mostrei
No vazio
(da passagem)
Debulho o que cessei
No vazio
(da passagem)
No vazio
(da passagem)
Liberei a alma?
No vazio
(da passagem)
Revirei o fato?
No vazio
(da passagem)
Alcancei o povo?
No vazio
(da passagem)
Refundei a arte?
No vazio
(da passagem)
Dívidas reavivadas
Buscas nas fases
Vazio
Decepções esperadas
Risos nas lembranças
Passagem
Escolhas superficiais
Prudências no tempo
Vazio
Trabalhos estressados
Bocejos no tumulto
Passagem
No vazio
(da passagem)
Coragem no vazio, na passagem!
Esperança no vazio, na passagem!
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